Bactérias podem ser do bem? Algumas sim, principalmente para combater outras bactérias que se mostram resistentes e nocivas ao corpo humano. Isso porque, certas doenças estão relacionadas a um desequilíbrio de bactérias, prejudiciais e benéficas. É o caso da retocolite ulcerativa.
Trata-se de uma doença inflamatória intestinal (DII) grave que caracteriza-se pela inflamação e feridas na mucosa do intestino baixo, e na qual observa-se uma redução de alguns grupos bacterianos que contribuem para a manutenção da saúde. Entre os principais sintomas estão cólicas e diarreia com sangue. Algo que ainda não tem cura e impacta diretamente na qualidade de vida da pessoa.
Neste sentido, um novo projeto envolvendo o Instituto de Biociências (IB) e a Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB) da Unesp, campus Botucatu, busca obter avanços nesta área. O estudo pretende avaliar a possibilidade de modulação do microbioma intestinal de pacientes com retocolite ulcerativa.
A particularidade desta pesquisa está na matéria-prima: fezes humanas. Sim, o cocô. Inicialmente pode parecer estranho. Talvez até nojento. Mas a verdade é que muitos cientistas têm estudado (e encontrado) soluções a partir das bactérias que habitam nosso intestino, região do corpo onde elas são encontradas com maior quantidade e diversidade.
Ou seja, a ideia é restaurar o equilíbrio da população bacteriana intestinal em favor daquelas que tem papel benéfico ao organismo. Basicamente, utilizando-se de material fecal de doadores sadios, uma vez que as bactérias do intestino se apresentam nas fezes.
Quem pode doar?
A dificuldade é encontrar voluntários. Neste caso, pessoas que possam doar suas fezes. Os interessados deverão, primeiramente, preencher um formulário on line [clique aqui] para avaliação das condições de saúde (entre outros pré-requisitos) do doador, que deve ter de 18 a 40 anos de idade.
Veganos e vegetarianos, em teoria, apresentam uma microbiota “mais saudável”, condição que os coloca em um patamar de bons doadores ou “super-doadores”. Porém, qualquer um que esteja com boas condições de saúde pode participar.
O processo de seleção é bastante rigoroso e mais criterioso do que para doação de sangue, de forma a assegurar que as fezes não contenham agentes de doenças. Em geral, de 10% a 20% dos candidatos se mostram aptos à doação. Além das informações apresentadas no formulário, os candidatos se submeterão a exames que poderão revelar informações importantes sobre sua saúde e microbiota intestinal.
As fezes doadas serão preservadas e processadas visando à transplantação para pacientes com retocolite ulcerativa. A expectativa é que o tratamento dure, no mínimo, oito semanas, justamente para que as bactérias possam se estabelecer no organismo. A eficiência deste tipo de tratamento, realizado em recentes pesquisas no exterior, tem animado cientistas e fortalecido a esperança de pacientes com este tipo de doença.
Apesar de ser mais comum em países desenvolvidos, esta enfermidade tem crescido em escala mundial. Nos Estados Unidos, por exemplo, estima-se que mais de 2 milhões de pessoas sofram com a doença. Estudo recente, realizado pela FMB, mostrou que no Estado de São Paulo, entre 2012 e 2015, o número de casos de DII subiu de 6,7 para 8 a cada 100 mil habitantes.
Bactéria em pílula
Segundo Prof. Dr. Josias Rodrigues, do Departamento de Microbiologia e Imunologia do IB e coordenador do projeto, financiado pela Fapesp, a técnica de transplante fecal não é uma novidade. A própria FMB, em 2014, já chegou a realizar o procedimento em dois pacientes, com transplante via intestinal.
Mas o objetivo, em um futuro breve, é poder inovar, realizando a transferência bacteriana por intermédio de cápsulas, por via oral, o que já é feito experimentalmente no exterior. “Para isto, precisamos de um grande número de voluntários ao processo de seleção, tendo em vista o baixo número de indivíduos aptos a doar”, argumenta do docente.
Reportagem: Agência 4 toques
This post was last modified on 12 de julho de 2019